quarta-feira, 27 de março de 2013

Milhares de centímetros


Eu gosto do fato de ter encontrado você. Sim, porque acho que fui eu que encontrei você, meio perdida que devia estar, mesmo sem perceber que estava. Ou talvez não estivesse e eu que prefiro fantasiar isso. Mas o fato é que gosto.

Gosto do seu olhar desde que o vi. Ou, quem sabe, até antes mesmo de vê-lo. Talvez porque eu já pudesse imaginá-lo, à minha maneira, quando queria supor a gente se olhando. Entorpeço quando você me olha sério, reto, intenso, castanho, quase oriental. À sua medida, oriental.

Gosto de ver você andando e quase rio quando se apressa. Porque você parece uma menininha de sete anos de idade, quando assusta os olhos e corre para fugir de um cachorro na rua, que nem está latindo para você. Mas não importa: você só quer ficar segura.

Gosto quando você erra o que quer dizer, porque “não era bem assim”, e percebe que falou besteira. Aí você se apressa em tentar corrigir, tentar me afagar, mas já sabendo que a besteira não foi ruim, que foi até engraçada, e você trata em deixar tudo mais engraçado e feliz. Talvez só para me ver sorrindo. Gosto também do jeito que você diz que gosta de me ver sorrindo.

Gosto como percebo tantos detalhes seus, mesmo os que não me agradam. Por exemplo, quando franze o cenho porque não gosta do que está acontecendo ao nosso redor e de como algumas coisas perturbam a nossa paz. Ou quando a parte inferior dos seus olhos, oposta à pálpebra e que eu não sei o nome, quase treme porque você resiste em dizer algo chato. Ou como o seu olho costuma ficar vermelho antes de ficar suado. Suado. Nada de choro. Ou como você dá tapinhas ou soquinhos nas minhas costas quando nos abraçamos e você não está totalmente entregue ao abraço.

Gosto do seu “sim” quando o mais comum para alguma pergunta minha seria uma resposta apenas com um verbo. Gosto do seu “daí” e da saudade que sinto dele. Gosto dos nossos códigos e de como certas coisinhas nossas foram criadas tão naturalmente. Gosto de parecer idiota contando kombis pelas ruas. Gosto mesmo.

Gosto de ter uma das suas coxas como travesseiro enquanto você descansa sua cabeça em uma das minhas coxas. Direita com esquerda ou esquerda com direita. A propósito, gosto da textura das suas coxas. Gosto apaixonadamente. Com sofreguidão.

Gosto da sua covinha, sobre a qual há muito não falo e da qual há tanto tempo gosto.

Gosto do seu contorcionismo tentando fugir da morte que a “cosquinha” causa.

Gosto do jeito sexy e doce, avassalador e meigo, arrebatador e pueril com que você age em muitos dos momentos em que estamos a sós. Do detalhe de cada toque. Dos dedos comprimidos contra as costas. Das unhas deixando marcas. Das marcas.

Gosto de como você consegue ser tão azul para mim, mesmo tendo o cabelo tão vermelho. E de discutir com você qual o jeito certo de segurarmos um a mão do outro, mesmo a gente já estando tão certos de que o certo é que o meu polegar fique à frente do seu.

Gosto de como sua cintura parece se afunilar ainda mais quando eu a “modelo” com minhas mãos e espalho meus dedos sobre ela. Mas antes de fazer isso, gosto de ficar apenas olhando-a, como se fosse a última coisa que eu pudesse ver ou fazer. E geralmente é assim com cada parte do seu corpo.

Gosto de ver você dançando, mas, mais ainda, gosto de como você, enquanto dança, consegue esquecer que pode me olhar nos olhos e faz isso.

Gosto de como tentamos ser amigos e de como conseguimos várias vezes. De como você usa as pontas dos seus dedos entre costelinhas minhas, de como deixa de ver certas coisas antes mesmo de fechar os olhos, de como fica molhada de suor sem transpirar.

Gosto, enfim, de estar escrevendo isso. Não para me declarar. Longe disso. Mas para fazer saber por que ainda estou aqui e o que me faz querer continuar. Não que outras coisas não existam. Mas essas existem e, em alguns momentos, isso é tudo o que importa.